CRISPR-Cas9: Edição genômica visando o aumento da imunogenicidade de vacinas
Como a utilização desta técnica biotecnológica melhora a eficiência de vacinas vivas
Dentre os vários tipos de vacinas existentes, as vacinas vivas (atenuadas) são as mais consolidadas e são utilizadas há centenas de anos na imunização da população. Estas vacinas possuem microrganismos vivos que passam por um rigoroso processo de atenuação, ao fim do qual são capazes de infectar as células e multiplicar-se no organismo, mas sem causar doença clínica. Elas têm o potencial de estimular a imunidade celular e uma resposta humoral mais longa em comparação às vacinas mortas.
Algumas destas vacinas, como a BCG (Bacilo de Calmette e Guérin) utilizada contra a tuberculose, sofreram um processo de atenuação da virulência “perdendo” fragmentos do seu genoma. Nesse caso específico, isso ocorreu após subculturas contínuas entre 1908 e 1919 (230 passagens) que resultaram, empiricamente, na atenuação da virulência e patogenicidade da cepa. Nos anos seguintes, a vacina BCG foi amplamente adotada e atualmente é usada na maioria dos países em desenvolvimento para a prevenção da Tuberculose (TB).
-Marca da aplicação da vacina BCG-
Embora o BCG seja crucial para proteção das crianças contra as formas mais agressivas da doença a eficácia do BCG contra a tuberculose pulmonar em adultos (forma mais prevalente da doença) demonstra uma variação de 0 a 80% de proteção, Isso contribui para o fato da tuberculose ainda ser a doença infecciosa que causa a maior mortalidade em todo mundo, apesar da existência de vacina e tratamento. As causas da variação na proteção são incertas e diversos esforços para gerar novas cepas de BCG com imunogenicidade aumentada estão sendo conduzidos.
Alguns estudos apontam para o fato de o BCG herdar estratégias imuno-evasivas de cepas virulentas de M. bovis, dessa forma, a cepa consegue “driblar” o sistema imunológico durante situações específicas, o que pode explicar essa variabilidade na eficiência da vacina. Nesse sentido, diversos esforços para gerar novas cepas de BCG com imunogenicidade aumentada estão sendo conduzidos.
Uma abordagem interessante é a utilização do sistema CRISPR-Cas9 para “nocautear” genes relacionados à evasão do sistema imune e/ou reinserir genes que codifiquem proteínas imunogênicas “perdidas” durante o processo de atenuação. O CRISPR é descrito como um sistema de defesa adaptativo de bactérias contra vírus e plasmídeos invasores, esse sistema foi adaptado para sua utilização como ferramenta biotecnológica por ser capaz de clivar e incorporar pequenas sequências do material genético invasor no próprio genoma bacteriano em regiões específicas. A técnica usa uma endonuclease Cas (Cas9), um RNA trans-ativador (tracrRNA) e uma sequência de direcionamento específica (crRNA). Este duplex crRNA:tracrRNA (sgRNA) pode se ligar ao Cas9 e conduzi-lo à sequência complementar no genoma. A troca da sequência de crRNA permite o direcionamento de qualquer sequência de interesse.
Genome Editing with CRISPR-Cas9 Trim:
- Fonte: McGovern Institute -
Dessa forma, gerando cepas com essas modificações genômicas pode-se aumentar a imunogenicidade da vacina. Essa abordagem é interessante pois obteríamos uma vacina segura, já utilizada há anos, otimizada para conferir uma melhor resposta imunológica contra a tuberculose.
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
Site da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIM)
CALMETTE, A. Preventive Vaccination Against Tuberculosis with BCG. Proc R Soc Med,v. 24, n. 11, p. 1481-1490, 1931.
Harding E. WHO global progress report on tuberculosis elimination. Lancet Respir Med. 2020 Jan;8(1):19. doi: 10.1016/S2213-2600(19)30418-7. Epub 2019 Nov 6. Erratum in: Lancet Respir Med. 2019 Nov 15;: PMID: 31706931.
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